quarta-feira, 28 de julho de 2010

Aconteceu você

Os pronomes estão trocados e o vento não tem trazido respostas.

É inverno e eu só lembro de não acreditar em tudo que me dizem porque eu estou carente e sentindo muito medo de ficar sozinha.

Mas você aconteceu, e era domingo. E domingo é sempre o dia mais longo da semana.

Entrei no carro, baixei os olhos. E, como sempre, fiquei desconfiada. Não consigo encará-lo quando falamos de amor, quando falamos de nós.

- O que você está ouvindo? – perguntei aumentando o volume do som.

- Tim Hecker. Conhece?

- Não.

- É um músico eletrônico, como você pode ouvir. Canadense. Não sei muito sobre ele. Este álbum se chama “Um país imaginário” e esta música “Sea of Pulses”, comprei outro dia.

Falou o título do álbum traduzido e o título da música em inglês. Deve ter tido um propósito.

- Mar de pulsos? Assim? – perguntei intrometendo minha fala nas palavras dele.

- É. Assim.

E me sorriu inteiro: de corpo, olhos, boca, dentes, face, mãos. Aquele sorriso dele que é mais de olhos do que boca, que é mais meu do que qualquer afirmação que ele não me faça.



Abri os vidros para sentirmos o vento. Saímos sem rumo. Como sem rumos somos. Um triângulo amoroso – eu, ele e Tim Hecker, que coitado, dançou na próxima curva, baixei o volume do som. Ficamos ouvindo o volume um do outro; dos pensamentos, dos tormentos, do silêncio, da respiração, da vibração.

O problema é que as pessoas sempre pensam que não sobreviverão quando não sobrevive o amor” – falei aumentando a voz. Não sabia se o meu amor iria sobreviver quando a chuva parasse e passasse aquela vontade desesperada de deitar a cabeça no colo dele e esquecer o mundo que já nem havia lá fora – do carro.

Antes que eu fizesse, ele fez. Encostou a cabeça no meu ombro. Fechou os olhos. E aquela situação mal resolvida de nunca sabermos quem éramos, onde estávamos e o que queríamos – de nós, de mim, de ele, do mundo, convalesceu quando ele se deitou em mim.

Tão secreto. Tão sagrado. Eu não sabia se deveria tocá-lo.

Toquei.

E confesso: não precisei de mais nada pelo o tempo em que ele também me tocou.

Se haverá amanhã no amor?

O amanhã é distante. É tudo que eu sei.


4 comentários:

Anônimo disse...

Que texto lindo, Larissa. Um dos seus melhores! Parabéns!

ELiane Lins.

Anônimo disse...

Sabe aquela impressão de "eu me senti lá"? Pois.
D. Larís, cada dia melhor. Esse texto ficou tão suave, que mais um pouco, e eu poderia jurar que a lágrima cairia.
Beijo carinhoso.
Lidi.

Laris. disse...

Own, Lidi.
Pois, se tiver vontade de chorar, chore.
Quando eu sou doce assusto, né?
Lari

Anônimo disse...

Lari,
Eu vou acumular as lágrimas pra outro post lindo como esse.
Engraçado, essa sua doçura nem me assusta e nem me surpreende. Acho que é uma questão de olhar além do que a outra pessoa quer mostrar. ;)
Lidi