quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

vésperas

Daí, que no meio do nada e longe de tudo eu lembrei que um dia falamos nisso. Talvez porque sempre de vezenquando me lembro do que falávamos, talvez porque seja véspera do ano novo e no último ano compartilhamos todos os anos dos nossos últimos.

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Sobre os elevadores...

Comecei a analisar até onde eu ia com aquilo. Ainda estaria esperando o elevador para subir mais uma vez, achando que, mais uma vez, o corredor era um lar. O caminho era cada vez menor, a vida estava passando da metade e eu emporcalhei uma camiseta dele que ficou comigo. Mas ele sempre me preferia nua. A carne é barata e um tabefe amacia e faz a pele tremer toda por dentro. Ele sempre dizia que meu corpo era quente e eu sempre chupava sua língua para sentir se o paladar ainda tinha gosto de cereja, das doses de kirsch que tomamos para não sentir as dores do abate na última vez.

Trocamos telefones, livros, CDs, filmes, confissões, favores, orgasmos, provocações, bebidas, música, palavras, banhos e as melhores trepadas da minha vida. Não queríamos que isso mudasse. Uma vez por semana, ele era meu e dividíamos até mesmo o chuveiro. Suas coxas eram o melhor lugar para minhas mãos estarem. Sua boca se encaixava perfeitamente em meus lábios. Suas costas largas, que eu gostava de apertar, eram montanhas que me conduziam ao cantinho mais íntimo do pescoço. O peito macio que afagava minhas costas era a segurança de todos os pensamentos e os orgasmos na garganta, o tormento de todas as partidas.

E assim, ele foi o homem mais educado que eu conheci.

Suspiro enquanto escrevo e vou tomar um café para aplacar a água na boca. Senão, coloco todas as memórias dentro de uma caixa úmida para ver se dá fungo e, assim, acabo com isso de uma vez. Se a caixa umedecer as minhas mãos, vou pensar nele e desejar espetar o meu corpo como se os dedos fossem lâminas afiadas por dentro da minha calcinha; como retalho de outro pano, qualquer pano, com manchas solares e gosto de amor.

Vê-lo entre as coxas me devolvia à maciez do encanto, enquanto ele se lambuzava com meu mel quente e vivo. Pelas frestas, o brilho dourado de sol, cor de mel, de moeda encontrada em velas piratas ao fundo do mar. Me fazia perder a vida ao horizonte e me ancorava em ilhas desertas em alto aMar, sem vista para o continente. Era um demônio solar.

Pela respiração, poderia saber que o corpo esperava a borrifada. E as gotas do nosso perfume pingavam lentamente no lençol com o meu suor. Era um desejo cada vez mais individualista. A gente se recolhia ao prazer mais íntimo, onde era estreito demais para alguém.

O nosso amor naufragou na primeira esquina. Comecei a sentir a aspereza dos grãos de areia atrapalhar a conflagração dos nossos corpos.

Nego fogo. Nego tudo.

Negue também.


quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Sobre se apaixonar por um amigo...

Minha melhor amiga está na fossa por amor. Pediu que eu lhe escrevesse uma crônica para se sentir melhor. Perguntei se ela não queria um email onde eu relatasse no passo a passo, técnicas de como superar ou tentar esquecer uma grande ilusão de anos. E ela foi taxativa: quero um texto pra chorar.

Não posso evitar de ser eu. Mas não queria estar escrevendo este texto por três motivos: conheço toda a história dos dois nos mínimos detalhes, passei a achar o cara – que é também meu amigo e alguém de quem gosto muito – um tremendo idiota e não me sinto a vontade pra falar do assunto porque estou sentindo muito por ela.

Terminar é difícil. Esquecer é difícil. Mas nas minhas poucas experiências, aprendi que tudo isso está na cabeça. Quando a gente resolve, tem que ir até o fim. Senão, a gente perde outras oportunidades, às vezes bem melhores, mais reais e menos complicadas, por estar com o coração e a mente ocupada com algo/alguém que não vale a pena. Esquecer um amor nada mais é que aceitar que acabou.

Já aconteceu comigo. E, certamente, já aconteceu com você.

A história da minha melhor amiga é linda e complicada como todo grande de amor que se constrói no meio de uma grande amizade. E aí, dá até parêntese para uma pauta que eu sempre defendo “seja a mulher porque homem não tem tesão na melhor amiga”. Quando você começa a misturar as coisas e compreender e entender e ouvir e aconselhar e abraçar a paixão vira carinho e paixão é carão.

O contrário pode dar certo, mas o avesso é difícil.

Lamento pela desilusão da minha amiga, ela não merece. É uma pessoa lindíssima, de bom caráter, ser humano raro que se não fosse tão ingênuo, beirava a perfeição. Ao longo desses quase 20 anos de amizade, já amei alguns homens e desamei - ela também, mas nunca a vi assim, de me ligar com uma vozinha de partir coração, de me pedir uma crônica de amor.

Mas antes ligar pra mim, que ligar pro idiota. Idiota. Idiota. E idiota é pouco.

Um conselho pra tomar coragem? Ele vai conhecer outra, resolva logo isso - dizia pra ela diversas vezes enquanto ela me contava de madrugas nos bares, ao telefone, internet e mensagens.

Daí lembrei do livro Pergunte ao Pó, de Fante. Abri minhas caixas da mudança para achar e copiar o trecho do texto exatamente como ele é:

Você tirou uma garrafa da bolsa e nós bebemos tudo, um gole pra você, um gole para mim. Quando a garrafa acabou, desci ao bar e comprei outra, uma garrafa grande. A noite toda, choramos e bebemos, e bêbado eu podia dizer as coisas que borbulhavam no meu coração, todas as palavras legais, as imagens bonita, porque você chorava por um outro cara e não ouvia uma palavra do que eu dizia, mas eu, eu ouvi, e Arturo Bandini estava ótimo aquela noite, porque ele estava falando com seu verdadeiro amor, e não era você, e nem era Vera Rivken, era apenas com seu verdadeiro amor

FANTE, J. Pergunte ao pó. Tradução de Paulo Leminski. 3.ed. São Paulo:Brasiliense, 1987. p. 131.

Não parece uma história de amor amigo? O cara lá, apaixonado, falando do verdadeiro amor e a outra bebendo e ouvindo tudo, como se fosse com ela, e ele dizendo como se fosse pra pessoa amada e ela se enganando na amizade, podendo saber logo se poderia ser amor.

Quando a gente se apaixona na amizade é assim - prefere se enganar alimentando as ilusões e tendo o outro como amigo, que perder tudo de vez.

Temos medo. E medo de perder duplamente -o amor e a amizade- é delicado. Medo de verdade é um talento que se aprende com os anos.