segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

O menino Gabriel


Quantos gols Pelé fez na copa de 58? Quem era o técnico do Botafogo nos títulos do campeonato brasileiro? Qual a atual seleção da Croácia? Há quanto tempo existe e como surgiu o futebol? Quantos países existem na Oceania e quais suas capitais? Pergunte ao garoto Gabriel, ele sabe.

Gabriel é a sensação do Nogueirão, do supermercado, da escola, da casa da avó, do avô, dos tios, dos amigos dos pais e claro, da prima babona. Gabriel tem 10 anos, a viagem mais longa que fez na vida foi para o Ceará (estado vizinho ao nosso), mas conhece a bola do mundo melhor que a palma da mão.

Sabe tudo de futebol. Qualquer coisa que se pergunte; qualquer nome de jogador, qualquer informação sobre campeonatos, qualquer formação de time, de qualquer década do Brasil, do mundo, do estado.

De férias do colégio, cumpri a antiga promessa de levá-lo comigo uma tarde dessas para o Jornal e ele foi à sensação da redação. Junto com os meninos do esporte ele fez a festa, deu uma aula e ainda ousou criticar o editor de esportes pela forma que “baba” o time estadual que ele torce.

Torcedor fanático do Botafogo e do Baraúnas é um verdadeiro ‘perna de pau’. No time de futsal do colégio atua como goleiro titular e me prometeu que neste ano será o atleta revelação dos jogos internos. Só que como toda criança, de vez enquanto saí com colocações que nos tira qualquer aprendiz de adulto de tempo.

No último sábado quando telefonei para saber como tinha sido a estréia do Botafogo no estadual, Gabriel declarou ter um assunto sério para conversar comigo. Tava viajando a trabalho e passei o final de semana na expectativa.

Hoje, quando soube que eu estava em casa, entrou no meu quarto, encostou a porta, fez uma expressão de vergonha e disse suspirando “Larissa, eu estou gostando de uma garota, eu sempre compro picolé pra ela no jogo, o pai dela é amigo de painho, mas acho que ela só quer ser minha amiga. O que eu faço? Esta semana vamos comigo para você vê. Ela é tão bonita. Você pode conversar com ela.” Na minha cabeça repentinamente veio o verso de Fabrício Carpinejar “Não me deixe viver o que posso; que me seja permitido desaprender os limites”. Vou pensar com carinho no seu caso sério, Gabriel. Palavra de cupido.

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Insônia


Tem feito muito calor esses dias. E eu odeio. Eu nasci no inverno, então posso me dar ao luxo de dizer que odeio o verão. Aqui, raramente chove e quando chove caí uma tempestade inunda tudo e minha maquiagem derrete desmanchando a moldura do meu rosto. Inclusive, hoje, especialmente hoje, resolvi sair sem maquiagem. Acho que o mundo precisava vê os meus olhos nus. As maçãs do meu rosto marcadas pelo sol que queimou minha pele na manhã do último domingo.

Além disso, tenho uma tremenda dificuldade de dormir e ontem foi pior, acho que é o calor. Antes eu levantava e ficava no computador, mas quando o dia amanhecia eu já estava enfadada para todos os afazeres que sol ia me trazer. Depois comecei a pensar antes de dormir. Nossa, pensava cada besteira. Lembro de uma vez que imaginei tomar uma dose de Martini Rosé num café de Paris conversando com o Caio Fernando de Abreu. Vê se pode? Faz anos que o Caio morreu e eu não bebo, daí a cena perde a lógica.

Tenho medo de sonhar até dormindo. Os sonhos me deixam inquieta por dias. Normalmente não lembro o que sonho, semana passada eu lembrei, sonhei uma situação que já tinha acontecido, sonhos, acontecem antes e depois de sonhados. Deve ser esse o meu medo de sonhar. Viver pesadelos. Mas existem pesadelos tão bons.

Lembrei agora de quando eu era criança. Morávamos na casa da minha avó e eu tinha medo do telhado. Todas as noites minha mãe tinha que contar histórias e eu ficava olhando bem nos olhos e na boca dela para não desviar a atenção e fixar os olhos no telhado. Quando perdi o medo, ficava contando quantas telhas formava cada quadradinho daqueles.

Engraçado. Senti falta do Jô Soares agora, mas a TV sempre me esperta e eu só queria dormir. Tentei ouvir músicas, no fone de ouvido, mas com a minha mania de cantarolar, vou aumentando o tom da voz e incomoda minha irmã no outro quarto, logo, só consigo dormir de bruços, e de rede, balançando. Não me concentro pra ler. Desisti de forçar o sono, vim escrever.

Às vezes o telefone toca de madrugada e depois eu consigo adormecer levemente. Se tivesse tocado hoje eu ia dizer tanta coisa, mas tanta coisa. Talvez conseguisse dizer tudo aquilo que escondo, por timidez, por vergonha, por falta de oportunidade, por precipitação. Sempre é assim. Só me resta às palavras, esse jeito de colocar palavras em todo o meu processo mental e saber que isso pode assustar as pessoas, e que é preciso disfarçar, jogar, esconder, mentir. Não sei viver assim. Quero tudo muito mais limpo e muito mais claro, mas os pensamentos não me deixam, o desejo de não precisar de nada se você me olhar, me tocar.

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

O Vestido de Noiva

Hoje fui escolher meu vestido de noiva e fui consumida pela aflição na sala de espera ouvindo a conversa sonhadora de outras duas noivas empolgadíssimas acreditando que vão ser felizes para sempre ou até que a morte as separe dos seus respectivos, enquanto eu, só queria remarcar o horário para a semana que vem. Não consegui.

Confesso que ao ver aquelas revistas estampadas com aqueles modelos brancos cheio de bordados e babados tive noção pela primeira vez o quanto é mágico encontrar alguém que sonha passar a vida inteira ao nosso lado e ainda que a vida inteira seja muito tempo e que nada dessas frescuras combinem comigo, apesar de não me ver de véu e grinalda eu sinto algo que não consigo entender. Parece que o mundo mudou.

A vida me entende, é justa comigo. Eu quem ainda não consegui entender a vida muito bem; ela sempre me deu tudo o que todo mundo quer: amor, uma família maravilhosa, amigos verdadeiros, sucesso no trabalho. Eu não deveria está perguntando o que me falta para ser feliz?

Nunca acreditei em príncipes encantados. Lembro que nas minhas conversas de adolescente enquanto todas as minhas amigas queriam casar, ter filhos, cuidar do marido, eu queria ficar independente financeiramente, morar sozinha e estudar na Europa. Tinha um paquerinha aqui, outro acolá, já sabia que eu conseguia amar sem apaixonar, sem sofrer por amor; então, me defendia de todos os olhares e de todas as palavras. Resultado: fui uma das primeiras a engatar um namoro sério, a noivar.

Meus planos mudaram claro, sempre mudam. E alguns foram bem diferentes do quê eu planejava. Mas o destino é assim. Tem essa mania de intentar por nós. Eu às vezes demoro a cair na real em algumas situações. Tudo passa tão rápido e essa minha mania intensa de viver o momento sem pensar no que poderia ter sido e não foi, ser passional demais, ser 9 ou 90, sempre.

De repente, vejo que as decisões da minha vida também dependem dos sonhos de outra pessoa. No impulso digo ‘sim’ para uma situação importante que por mais que haja sentimentos e todas as condições necessárias não há a gana pro primeiro passo. Medo de não ser feliz, quizás. Medo de não ter vivido tudo.

Escolhi o vestido. Será uma réplica atualizada do da minha mãe. Não será branco. Não terá véu. Não terá grinalda. Será simples. Clássico. Por mim, não teria nem essas formalidades. Já estou começando a sentir os primeiros “pesos” do casamento e "ainda é cedo, amor..." ; eu, quem sempre decidiu tudo sozinha.

segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

O Botafogo me escolheu


Tenho um trato com meu noivo de não conversarmos sobre futebol, ou melhor, de não conversarmos sobre Flamengo e Botafogo. Ele quase nunca se agüenta, é quase satisfatório fazer comentários. A verdade é que ele só faz pra me encher, nem de futebol gosta e geralmente quem leva o sermão por ir a uma partida com os amigos sou eu.

Dia desses no Posto de Gasolina entrei à loja de conveniência enquanto ele abastecia o carro. Quando voltei, ele estava conversando com um ex- professor de faculdade; que comenta irônico “vixe, você ainda não convenceu a mudar de time?” (eu estava com uma camisa do Botafogo) e ele responde risonho “ela é masoquista, professor”.

Piada sem graça e motivo suficiente para passar o resto da tarde sem falar com ele direito. Quando a raiva passou, pensei que jamais o Botafogo o escolheria como torcedor. E automaticamente lembrei o trecho de uma crônica de Paulo Mendes Campos que todo botafoguense de cara se identifica e diz:

“A mim e a ele (Botafogo) soem acontecer sumidouros de depressão, dos quais irrompemos eventualmente para a euforia de uma tarde luminosa.

Sou preto e branco também, quero dizer, me destroço para pinçar nas pontas do mesmo compasso os dualismos do mundo, não aceito o maniqueísmo do bem e do mal, antes me obstino em admitir que no branco exista o preto e no preto, o branco.

(...)


Reagimos ambos quando menos se espera; forra-nos, sem duvida, um esforço neurótico. Se a vida fosse lógica, o Botafogo deixaria de levar o futebol a sério, fechando suas portas; eu, se a vida fosse lógica, deixaria de levar o mundo a sério, fechando meus olhos.

(...)

O Botafogo, às vezes, se maltrata, como eu; o Botafogo é meio boêmio, como eu; o Botafogo sem Garrincha seria menos Botafogo, como eu; o Botafogo tem um processo, como eu; o Botafogo é mais surpreendente do que conseqüente, como eu; ultimamente, o Botafogo anda cheio de cobras e lagartos, como eu.

O Botafogo é mais abstrato do que concreto; tem folhas secas; alterna o fervor com a indolência; às vezes, estranhamente, saí de uma derrota feia, mas orgulhoso e mais botafogo do que se houvesse vencido; tudo isso, eu também.

Enfim, senhoras e senhores, o Botafogo é um tanto tantã (que nem eu). E a insígnia de meu coração é também (literatura) uma estrela solitária”.


Todo botafoguense tem a sensibilidade à flor da pele. Assim como eu, Vinicius, Mendes Campos, Augusto Schmidt, Olavo Bilac, Fernando Sabino, Clarice Lispector, Nelson Rodrigues, Glauber Rocha, Otto Lara Resende, Luis Fernando Veríssimo, Antonio Cândido de Mello e Souza, João Saldanha, Armando Nogueira, Juscelino Kubitschek.

Agora, vem cá, me diga sinceramente uma coisa: sabe lá você o quê é torcer pelo Botafogo? Sabe lá você o quê é ser feliz na prorrogação?

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

Eu e a moda, a moda e eu.


Desculpe Glorinha Kalil, todas as butiques e grifes, todas as revistas femininas e todos os meus amigos colunistas sociais, mas desfiles de moda são um ‘programa cultural’ que eu não faço, aliás até a semana passada nunca tinha feito e pretendo nunca mais fazer.

Existem certas programações do mundo feminino que não me dão tesão, sinceramente, prefiro uma partida de futebol Potiguar x Baraúnas com o Nogueirão lotado do quê meia hora sentada sentindo cheiro de gelo seco e vendo aqueles modelitos estranhos passando na minha frente. Ou você vai-me dizer que sairia na rua com aqueles penteados, maquiagens e roupas?

Nada contra os modelos, os estilistas, as passarelas. Alguns desfiles são verdadeiros shows de produção. E se um dia você quiser fazer um programa fantástico vá ao show que a Victoria’s Secrets promove para apresentar suas novas coleções.

Bem, recebo dezenas de convites, agradeço e nunca vou. Mas essa semana uma das minhas melhores amigas organizou um mega desfile trazendo até globais à sua passarela, já tinha consigo fugir; mandei flores e ela me ligou agradecendo e pedindo “pra dar um jeitinho” mesmo sabendo que não tinha um jeitão que desse jeito. Para minha sorte, fomos fazer a unha justamente na mesma hora e local, já imaginaram, ela me chantageou as pitangas. Cheguei em casa enfadada de tanta imploração e a piada de “ahhh, não vai arrancar pedaço. Você tá ficando velha e chata”.

Vencida pelo cansaço, fui e confesso: foi até divertido. A comida estava ótima, o vinho ao ponto, os gays podendo usar purpurina e maquiagem, as mulheres sustentadas pelos maridos fotografando com seus iPhones, os colunistas sociais pedindo àquela blusa belíssima como pagamento pela notinha em destaque, os fotógrafos atentos a cada cochicho das “personalidades” e as pessoas velhas e chatas contanto os minutos para abraçar a dona da butique e ir embora.

Dei até ótimas gargalhadas quando uma patricinha reservou uma peça com um cheque ouro de um bam-bam-bam casado que estava lá com a esposa lipoaspiradíssima para o verão. Ah, acho linda a vida nas colunas sociais. Todo mundo é tão amado e feliz.

Mas foi recompensador vê a alegria da minha amiga. Senti como se fosse uma realização minha. Até derramei uma lágrima de emoção. Ela merece o sucesso que foi e cada um escolhe o moinho que lhe satisfaz.