quinta-feira, 18 de junho de 2009

Um beijo que tivesse blue

Acordou deprimida. Ligou o chuveiro e deixou a água escorrer como se esquentasse água na chaleira. Ficou fazendo hora para se molhar. O cheiro do alvorecer lembrava os dias na fazenda. Mato. Chuva. Pasto. Um cheiro incomum na cidade. Um aroma estranho para um dia daqueles.

Não quis café. Talvez estivesse quente. Queria qualquer coisa que viesse com o amanhecer. Esperou. Saiu caminhando sem se ligar nos movimentos, nem saber até onde ia. Voltou. Entrou no carro. Ligou o som. Ouvia a voz doce de Zizi Possi cantando “meu bem quer, tem um quê de pecado...” como se fosse uma dose de adrenalina para animá-la a viver. Perdeu os sentidos. Espertou com as buzinas dos carros entoando como flautas doces. Suaves. Distantes.

Estacionou. A loja sombria e velha no centro da cidade lhe chamou a atenção. Era uma colecionadora de coisas antigas. Adorava ter algo raro no seu acervo. Queria viver de passado. Queria sim. Jamais esperaria algo que se deve. Surpreender é o forte. Entrou. Caminhava lentamente entre as prateleiras. Retas. Paralelas. Passos curtos. Flutuantes. Parecia ter medo do que poderia encontrar.

O celular tocou. Uma, duas, três, quatro vezes. O toque. Novamente entoava como uma flauta doce. Suave. Distante. Continuou dedilhando o chão com as pontas dos dedos dos pés. Não, não acordaria o passado.

...
Derrubou um livro.

Este livro.

É jazz do coração. É prosa que dá prêmio. É como diria Ana Cristina César “um tea for two total... tilintar de verdade que você seduz”. Esbarrou nos versos dela com a verdade, a toda, de enfiar carapuça. Cantou.

É doce. É mel. É puro açúcar branco e blue.

Queria um beijo de açúcar. Ao ponto. Não amargo. Não meio amargo. Não enjoado.

Na Face. Na testa. Na boca. Na nuca. Nas mãos. Nos ombros. No seio.

Queria um beijo que tivesse blue.

Sorriu. A água já estava no ponto.

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