terça-feira, 29 de março de 2011

Um dia sem policromia

O dia acordou preto e branco. Era por volta das 5h da manhã quando o carro da Sucan (sei que hoje se chama Vigilância Sanitária, mas eu não gosto de nome enfeitado) quando o carro da Sucan passou na minha rua soltando aquele fumacê. Sempre fui daquelas pessoas que dormem pouco e têm o sono leve do tilintar dos pés. Ultimamente, intranquilos. Não vejo a hora de “certa manhã acordar de sonos intranquilos” como no CD do Otto, cantor gente boa, ex Mundo Livre S/A, eterno intranquilo, como eu.

Hoje o dia acordou preto e branco e depois que o carro da Sucan passou fazendo aquele barulho e soltando aquele fumacê na rua da minha casa eu não consegui mais dormir, e também não consegui acordar porque estava tudo preto e branco.

Por um momento deu um desespero por não conseguir enxergar nada, tentei me levantar tateando os punhos da rede e enganchei os meus punhos na varanda e quase me esbarrando com o chão e machucando toda a minha tentativa de encontrar meus óculos de grau sobre o móvel da TV. Achei os óculos e o quarto continuava preto e branco. Esfreguei-os e nada. Fui até o guarda roupa, e este tem sim, as portas brancas, procurei um colírio ou uma loção que removesse o preto e branco que eu achava que eram resquícios da maquiagem do dia anterior (é, vezenquando eu durmo de maquiagem com preguiça de tirar mesmo), as paredes estavam brancas, o teto preto, não via as tomadas para acender as luzes. Tudo preto e branco.

O dia acordou preto e branco e eu consegui abrir a porta do meu quarto que dá pro meio do caminho entre a sala de estar e jantar. As paredes rosadas estavam brancas. Abri as janelas que são brancas e o dia lá fora estava amanhecendo, branco. Ninguém acordou. Tudo continuou preto e branco e eu fui aos poucos me adaptando com a falta de cor nas frutas da geladeira, nas roupas no guarda-roupa, na maquiagem no banheiro. Depois do susto quando me olhei no espelho, tive que me adaptar a mim em tons de preto e branco. Sem cores. Olhei imediatamente pras unhas, lembrei que elas estavam pintadas de verde e ali sim, eu poderia encontrar cores, e logo verde, né?! Esperança. Mas 'a esperança dança' como canta João Gilberto e minhas unhas estavam pretas. Sem esperanças. O dia todo acordado em preto e branco e eu fui me abatendo com isso. Sem ver as cores das coisas, os tons, as graças.

Fui trabalhar sem palavras, nem bom dia. Apanhei os jornais, terça-feira, 29 de março de 2011, um dia sem policromia. 6:45h. O céu branco, as crianças brancas, as árvores brancas, as ruas tão pretas que parecia noite. Resolvi tomar café no mercado, lá tudo é sempre muito colorido, era.

O dinheiro preto, o café branco. Sem cores tudo é tão amargo.

Tentei ouvir um samba pra tentar ver se os tons coloririam como vento quando passa e colore as manhãs que nem comercial de margarina. Até o samba era Retrato em Branco e Preto.

O dia acordou preto e branco.

É que,

O amor descoloriu.

5 comentários:

Luana disse...

já falei que adoro as coisas que tu escreve? =D

Anônimo disse...

Já ontem, no café do Cafezal, um nobre Moço me comentava com o olhar longe: Larissa nunca mais apareceu. Se aquela mulher me amasse... Eu faria um samba por dia só porque ela merece todas as alegorias.
Respondi: Pois é. E eu ainda escreveria uns poemas todas as manhãs.
Tão linda, que afronta as outras que passam. Elas sempre passam e você vai ficando, ficando...
Cadú

Laris. disse...

Lua,
já, já falou. Obrigada!!!!
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Cadú,
que surprise mais drinks você aquiiiiii! Deixe de exagero! Deixe de exagero. Quem foi esse Moço tão nobre e carente de amor? Tsc,
Saudades!

André Miranda disse...

Cores de Almodóvar, já!

carlos santos disse...

Moça, boa tarde.
Amor é sempre amor! em papel machê (Vida é fazer
Todo o sonho brilhar
Ser feliz); na trilha de pés descalços na praia; no olhar vago que ondula na água guardada em concha por nossas mãos. É colorido ou preto e branco? Tem tato, olfato, audição... todos os sentidos. Acima de tudo é intenso perto ou distante, porque é amor. Ah! Ia esquecendo: quanta preguiça, heim? Escreva mais e mais, mesmo as desventuras, quase Dolores Duran, lamúrias de Piaf. Não importa. Escreva, escreva, escreva... Carlos Santos