Minha melhor amiga está na fossa por amor. Pediu que eu lhe escrevesse uma crônica para se sentir melhor. Perguntei se ela não queria um email onde eu relatasse no passo a passo, técnicas de como superar ou tentar esquecer uma grande ilusão de anos. E ela foi taxativa: quero um texto pra chorar.
Não posso evitar de ser eu. Mas não queria estar escrevendo este texto por três motivos: conheço toda a história dos dois nos mínimos detalhes, passei a achar o cara – que é também meu amigo e alguém de quem gosto muito – um tremendo idiota e não me sinto a vontade pra falar do assunto porque estou sentindo muito por ela.
Terminar é difícil. Esquecer é difícil. Mas nas minhas poucas experiências, aprendi que tudo isso está na cabeça. Quando a gente resolve, tem que ir até o fim. Senão, a gente perde outras oportunidades, às vezes bem melhores, mais reais e menos complicadas, por estar com o coração e a mente ocupada com algo/alguém que não vale a pena. Esquecer um amor nada mais é que aceitar que acabou.
Já aconteceu comigo. E, certamente, já aconteceu com você.
A história da minha melhor amiga é linda e complicada como todo grande de amor que se constrói no meio de uma grande amizade. E aí, dá até parêntese para uma pauta que eu sempre defendo “seja a mulher porque homem não tem tesão na melhor amiga”. Quando você começa a misturar as coisas e compreender e entender e ouvir e aconselhar e abraçar a paixão vira carinho e paixão é carão.
O contrário pode dar certo, mas o avesso é difícil.
Lamento pela desilusão da minha amiga, ela não merece. É uma pessoa lindíssima, de bom caráter, ser humano raro que se não fosse tão ingênuo, beirava a perfeição. Ao longo desses quase 20 anos de amizade, já amei alguns homens e desamei - ela também, mas nunca a vi assim, de me ligar com uma vozinha de partir coração, de me pedir uma crônica de amor.
Mas antes ligar pra mim, que ligar pro idiota. Idiota. Idiota. E idiota é pouco.
Um conselho pra tomar coragem? Ele vai conhecer outra, resolva logo isso - dizia pra ela diversas vezes enquanto ela me contava de madrugas nos bares, ao telefone, internet e mensagens.
Daí lembrei do livro Pergunte ao Pó, de Fante. Abri minhas caixas da mudança para achar e copiar o trecho do texto exatamente como ele é:
Você tirou uma garrafa da bolsa e nós bebemos tudo, um gole pra você, um gole para mim. Quando a garrafa acabou, desci ao bar e comprei outra, uma garrafa grande. A noite toda, choramos e bebemos, e bêbado eu podia dizer as coisas que borbulhavam no meu coração, todas as palavras legais, as imagens bonita, porque você chorava por um outro cara e não ouvia uma palavra do que eu dizia, mas eu, eu ouvi, e Arturo Bandini estava ótimo aquela noite, porque ele estava falando com seu verdadeiro amor, e não era você, e nem era Vera Rivken, era apenas com seu verdadeiro amor
FANTE, J. Pergunte ao pó. Tradução de Paulo Leminski. 3.ed. São Paulo:Brasiliense, 1987. p. 131.
Não parece uma história de amor amigo? O cara lá, apaixonado, falando do verdadeiro amor e a outra bebendo e ouvindo tudo, como se fosse com ela, e ele dizendo como se fosse pra pessoa amada e ela se enganando na amizade, podendo saber logo se poderia ser amor.
Quando a gente se apaixona na amizade é assim - prefere se enganar alimentando as ilusões e tendo o outro como amigo, que perder tudo de vez.
Temos medo. E medo de perder duplamente -o amor e a amizade- é delicado. Medo de verdade é um talento que se aprende com os anos.
3 comentários:
Minha musa e dos intelectuais, lembro bem quando aconteceu com você. Mas você não vale. Saudades, Nêga.
Já aconteceu comigo tb. ;) Mas eu tenho certeza, dadá me disse, que qdo casar passa.
Já aconteceu comigo tb. ;) Mas eu tenho certeza, dadá me disse, que qdo casar passa.
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